sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Belém Do Pará

Hoje posso refazer e expor todo o processo dessa viagem que roda como a um filme na minha cabeça. Ter planejado vir de bicicleta para o FSM em Belém não me surgiu como a primeira alternativa, porém com o tempo, nos corredores da faculdade em período de final de semestre a idéia de dar vida ao projeto um tanto (foto)etnográfico foi se construindo, onde vejo na bicicleta um meio de transporte barato, e sobretudo por ser o instrumento que possibilita colocar-me em campo, partilhando e conhecendo outras realidades psicosociais-regionais com uma outra ótica, com um outro modo de ver e também de ser visto. E por essas e outras convicções mantenho firme a idéia de viajar de bicicleta, de me permitir sentir um pouco de cada lugar, de cada canto, me inteirando com a natureza, através de meus esforços, quebrando barreiras inaudiveis, invisíveis, se perdendo pelas veredas para se (re)encontrar logo adiante.
Doravante saber que foi tudo real e o que parecia loucura ou falta de senso para outros tornou-se acreditar, conviveram com a esperança de chegar, com os relatos da viagem, mentalizaram que onde quer que eu estivesse estaria seguro, estaria na santa paz. O projeto de viajar e fotografar de bicicleta não tem término nesta viagem, mas a experiência adquirida irá somar para futuras ciclo(pesquisa)viagens. Posso dizer que conheci um pouco do Norte-Nordeste do Brasil, observando e me inteirando nos costumes de cada região, de cada localidade, convivendo com as figuras sociais como pescadores, agricultores, donos de fazendas, garimpeiros, pessoas que no decorrer do percurso encontrava.

Reconstruir um mês tão intenso de uma rica aprendizagem intelectual, espiritual e humanitária não é tão fácil de expor em linhas tortas, aqui tão lineares, mas é tão espontânea as lembranças que me tomam por horas; da humildade em saber chegar, dos sorrisos das crianças, da grandeza da natureza, do acolho das pessoas e do cheiro de café dos fins de tarde aos banhos de igarapés do Pará. Foi só um mês, pois se me perguntarem o que fiz ou aonde estava no décimo quinto dia de viagem irei contar um pouco da minha saga.
Se me perguntarem qual foi a parte mais complicada da jornada escolheria o seu antes, o antes de tudo virar um corpo, virar vida, as despedidas, os dramas, a questão financeira, a tentativa do planejamento, a ansiedade para começar a jornada foram pontos que desprenderam esforços, parte inevitável de todo e qualquer projeto. O durante não é tão difícil, o mais difícil depois do antes são os dias quentes, a saudade das pessoas, familiares, da caminha quentinha, do conforto da casa, da comidinha da mamãe, enfim, nada que dê para se desesperar, pois há esperanças no caminho, por entre ele, as veredas. Há encontros e despedidas, há magia em estar disposto em viver como nômade, há conhecimentos as vezes inexplicáveis e um sentir dúbio entre grandeza e o que é pequeno diante do planeta terra.
Miséria, sofrimento, fome, sede quase não vi, claro que vi sim, nas cidades grandes vi de tudo, egoísmo, mesquinharia, humilhação, sofrimento, dentre outras mazelas de centros urbanos. Perigo quase não sofri, só o de dormir numa rede entre galhos de uma caramboleira, e das formigas, insetos, varejeiras, urubus que me impregnavam o juízo quando os tinham por perto. Muitos ao me verem diziam ou perguntavam: ´´quanta coragem, ô cabra corajoso, você está vendendo algo?, é promessa?, isso é loucura!´´ Eu, porém já não me via no direito de contradizerem, o que poderia eu fazer? Loucura para mim é a vida nas cidades, suas contradições, conflitos, a marginalização dos indivíduos, a carência de compaixão, os horários, a correria cotidiana, o barulho infernal, fumaça e os engarrafamentos intermináveis.

Amigos, foram tantos que fiz pelos caminhos onde passei, amizades fraternas, maternas, irmãos que com o apoio e acolho das palavras e coisas materiais ajudaram a fortalecer toda a viagem, fizeram valer todo o suor diário. Outras amizades foram construídas através do Blog, ferramenta que eu particularmente não dava muita coisa à ela, mas me surpreendeu a receptividade para o projeto daqueles que acompanharam o caminho.Muitos foram os lugares onde acampei, onde descansei um pouco do meu cansaço, aonde foi possível parar a bicicleta, conversar com moradores, explicar todo o projeto para então de repente me abrigarem em suas casas ou quintais, dando um bom banho depois de um dia de pedal, uma boa comida com quase sempre boas conversas. Quando não, tive que acampar em escolas públicas, faculdades, postos de gasolina onde havia banheiro com banho e um espaço para montar a barraca.Experimentar novas situações me fizeram valorizar e respeitar a natureza, a natureza de cada indivíduo, a expressão mais bonita que é o amanhecer e o entardecer do dia. Hoje estou um pouco mais forte para poder ser, acreditar no que será e no que há de vir a ser. O tempo vai, já estou em Belém quase duas semanas. O FSM aconteceu imerso a contradições e conflitos ideológicos, desorganização, enfim, mas mesmo assim foi interessante poder partilhar com amigos cearenses e amigos de outras regiões do Brasil e da América do Sul.
Ando conhecendo um pouco de Belém, me perdendo para me encontrar em praças que aqui possuem muitas, indo no Ver-o-Peso que é uma das maiores feiras livres da América do Sul, assistindo filme no Olympia um dos cinemas mais antigos do Brasil. Tomando sorvete de Açai, suco de cupuaçu, cozinhando um pouco do meu tempero para @s amig@s, me alimentando de alegria por estar envolto por boas amizades.
Agora aproveito o fruto dos esforços que fiz para poder chegar aqui, chegar tão bem quanto eu sai de minha cidade. A saudade bate, mas logo voltarei e para confessar a volta digo que sinto medo dessa volta. A volta é sempre mais difícil, pois requer um readaptar, a volta para mim é um sentimento contraditório, pois na medida em que quero ver as pessoas queridas, estar na minha casa ao mesmo tempo quero prolongar a viagem para conhecer outros lugares, outros modos de vida, etc.
Um pouco do meu olhar foi posto nesse blog, um pouco de cada experiência foi posta aqui, agradeço aos que acompanharam essa viagem, agradeço aos que apoiaram e deram força nas horas mais apropriadas, fico feliz pelo carinho de tod@s. Para os curiosos que querem saber como irei voltar, posso dizer que ainda não sei, a viagem ainda não terminou, ainda estou de férias e quero aproveitar um pouco dela, Fortaleza-Ce será minha Próxima Estação, onde penso em passar o carnaval na serra. Um Forte Abraço para tod@s, fiquem bem, felicidade e amor.


Agradecido , Rodrigo P.